sobre camas e espaços
Sempre dormi em camas grandes. Desde que saí do quarto-de-criança pro quarto-de-adolescente a minha cama não é de solteiro. Quando me mudei para Florianópolis, então, ganhei de presente o colchão mais gostoso - e grande - no qual eu já dormi. Troquei de apartamento e o colchão veio comigo, dei meu jeito de fazer caber no quarto novo.
Mas nem sempre dormi sozinha. Entre amores e amigos, ter um colchão grande parece em teoria o melhor espaço para compartilhar. Há exceções: quando a gente se apaixona um colchão grande é o pior espaço para se estar. A vontade é de dormir em cima da pessoa, ocupando o menor ambiente possível para se fazer cada vez mais perto.
O contrário quando se está sozinha, que parece que quanto mais se espalha sobre a cama mais falta lugar. Rolar de um lado pro outro buscando ocupar toda a superfície possível, porque se tem espaço demais.
Daqui duas semanas vou para a Dinamarca e a minha cama por seis meses vai ser uma cama de solteiro. No momento em que mais vou estar desbravando lugares, menor vai ser o meu espaço. Me fez refletir sobre as limitações que me esperam sendo uma mulher em um país que fala uma língua diferente das que estou acostumada, sendo uma pessoa estranha a hábitos e costumes que já estão estabelecidos.
As limitações, ainda que presentes, não impedem o espaço que toma o meu desejo. Esses dias, lendo o livro “A gente mira no amor e acerta na solidão” da Ana Suy (agradeço aqui minha amiga Isabela e nossas partilhas psicanalíticas), me deparo com o seguinte trecho:
Desejo é desejo de desejo na medida em que desejar nos satisfaz. O desejo é um buraco ao contrário, que, quanto mais tentamos tamponar, mais abrimos.
Nos últimos dias a frase pulsou na minha mente, escancarando como nossas expectativas são o que nos movem. Me sinto satisfeita desejando, geralmente mais do que concretizando o próprio desejo. É o espaço que a falta tem. São nossos sonhos que nos impulsionam a continuar.
E eu sonho grande. Tenho certeza que mesmo em uma cama de solteiro eu vou ter espaço o suficiente pra continuar rolando de um lado para o outro. Porque esse espaço está dentro de mim, um vazio para sempre sendo preenchido.
Criei no final de 2021 uma conta no Instagram para servir de diário. Gosto muito de poder compartilhar com as pessoas mais próximas de mim tudo o que acontece nos meus dias, além de poder revisitar as memórias com facilidade.
Comentando com minha amiga Beatriz sobre a falta que me fazia escrever, ela sugeriu criar uma newsletter. Então cá estou, na metade de 2022, criando outra espécie de diário, um lugar para compartilhar meus devaneios, delírios e divagações. Colocando um pouquinho da bagunça da minha mente em diferentes formas de escrita.
701 é o número do meu primeiro apartamento, no qual morei por 17 anos. Acredito que muito do que vou escrever aqui tem a ver com o que me moldou desde o início da vida. Por isso o nome: Boletim 701.